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Advocacia Manhães de Almeida

Penhora de bem de família de fiador em contrato de locação comercial

O bem de família representa a proteção no sentido de abrigar e tomar conta de sua propriedade residencial, para que nada recaia sobre seu único patrimônio, protegendo, assim, sua família. Esse caráter protetivo está presente no art. 6º da Constituição Federal, quando se lê que “São direitos sociais ... a moradia”.


Para se ter efeito, o convencional é que os cônjuges, ou entidade familiar, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, lavrem escritura pública ou testamento em qualquer Tabelião de Notas e inscrevam no Oficial de Registro de Imóveis do “bem” imóvel residencial. Com isso, o ato se tornará público e não poderá ser alienado livremente, apenas com autorização judicial.


Com o advento da lei 8009/90, restou imediatamente instituída a proteção do bem de família, sendo ele impenhorável, no caso de imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar residindo no imóvel, ou aquele de menor valor em caso de haver diversos imóveis; portanto, não respondendo em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de qualquer natureza, e aderido automaticamente ao sistema, ficando optativa a lavratura de escritura, bem como sua inscrição no Registro.


No ano posterior, foi incluído, à lei de impenhorabilidade do bem de família, o inciso VII do art. 3º através da Lei 8245/1991, prevendo a exceção para a aplicação da penhora do bem de família no caso de processo por obrigação decorrente de fiança em contrato de locação.


Ou seja, se o fiador de um contrato de locação, der como garantia o seu “bem imóvel”, deixará ele de ter a proteção dada pela Lei 8009/90, renunciando, assim, o seu bem de família, podendo seu único bem imóvel ser penhorado, se inadimplente o locatário.

A Súmula 549 do STJ estabelece que:


“É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação.” (REsp 1.363.368)


O tema é atualmente pacificado pelo STJ e pelo STF sobre a constitucionalidade da penhora do bem de família do fiador pela inadimplência do locatário.

Em junho de 2018, o STF decidiu, através de Recurso Extraordinário (RE) 605709, que não se pode penhorar o bem de família do fiador se o imóvel objeto da locação for comercial; porém, surge a dúvida em relação ao argumento de que deve ser protegido o bem de família residencial, garantindo o direito à moradia e o princípio da Isonomia.


E M E N T A


RECURSO EXTRAORDINÁRIO MANEJADO CONTRA ACÓRDÃO PUBLICADO EM 31.8.2005. INSUBMISSÃO À SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. PREMISSAS DISTINTAS DAS VERIFICADAS EM PRECEDENTES DESTA SUPREMA CORTE, QUE ABORDARAM GARANTIA FIDEJUSSÓRIA EM LOCAÇÃO RESIDENCIAL. CASO CONCRETO QUE ENVOLVE DÍVIDA DECORRENTE DE CONTRATO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEL COMERCIAL. PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR. INCOMPATIBILIDADE COM O DIREITO À MORADIA E COM O PRINCÍPIO DA ISONOMIA.


Na prática, as garantias contratuais de um instrumento de locação são acessórias para garantir a obrigação principal. Na obrigação principal, o locatário tem que realizar o pagamento do aluguel. Neste contrato, um terceiro se apresenta para garantir o pagamento do aluguel, colocando seu patrimônio com o nome de fiador, com o objetivo de dispor ao credor locador em caso de inadimplência.


A Lei 8009/90 não faz distinção entre locações de imóvel comercial ou residencial.


A corte, a meu ver, não discutiu a obrigação acessória da penhora do imóvel, mas a obrigação principal, dando mais ênfase ao tipo de contrato de locação em que o credor locador está efetivamente firmando - no caso, o de locação comercial. Isso traz imensurável prejuízo ao mercado imobiliário, pois costumeiramente imobiliárias ou administradoras de imóveis comerciais, por ser um ato menos oneroso, bem como relativamente mais fácil, “aceitam” a garantia de um fiador que tenha imóvel residencial e que possa prestar fiança no caso da inadimplência do locatário. Matéria essa já exaurida, na qual caso ele se apresente declarando este não ser bem de família, nada mais há de se falar sobre o tal bem de família. Outra modalidade de garantia, ou até mesmo a exigência de um novo fiador com a apresentação de mais de 1 matrícula de imóvel, podem afetar e dificultar o dia a dia dos negócios imobiliários, desestimulando os locadores.


É importante observar que o TJSP possui precedentes que desconsideram a decisão do STF e é bem possível que tenhamos novos pronunciamentos sobre a matéria versada.


A hipótese que veio à tona é matéria ainda controvertida no próprio STF, pois apesar da 1ª turma decidir sobre o caso afetando os inquilinos comerciais e os locadores, aguardam-se novos pronunciamentos da Corte e opiniões de ministros de outra turma. Em recente publicação, datada de 24/06/2019, a ministra Rosa Weber, admitiu os presentes embargos de divergências. Aguardamos ansiosamente a uniformização da jurisprudência, preferencialmente no sentido de prevalecer o entendimento da penhorabilidade do bem imóvel do fiador, independente de se tratar de locação para fins residenciais ou não residenciais.



Por Priscila Jardini

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