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Advocacia Manhães de Almeida

Lei da Acessibilidade e os Contratos de Locação de Imóveis Urbanos

As responsabilidades do Locatário pelas adequações relacionadas a Lei de Acessibilidade

Em 19 de dezembro de 2000, foi promulgada a Lei nº 10.098, que “estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida” e que traz, em seu artigo 1º, a definição de acessibilidade. Vejamos:

I - Acessibilidade: possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida;

Com o advento da Lei 10.098/00, os imóveis tiveram que ser adaptados para o atendimento de pessoas nas condições ali definidas, provocando, por conseguinte, o surgimento de questões envolvendo os contratos de locação, sobretudo de imóveis com finalidade não residencial.

Um dos pontos controvertidos diz respeito à responsabilidade de adequar o imóvel à nova legislação, se do locatário ou do locador.

Citemos alguns exemplos das exigências legais:

· Ao menos 5% das mesas de trabalho / refeições devem ser acessíveis a pessoas com cadeiras de rodas. A altura destas pode variar entre 0,75 e 0,80 metros do chão, com avanço mínimo de 0,50 metros;


· A ABNT determina que toda área de circulação deve ter espaço de circulação de, no mínimo, perímetros de 0,80 por 1,20 m e espaços suficientes para manobras de cadeiras de rodas;


· Todo estabelecimento comercial deve ter uma estrutura de sinalização adequada a pessoas que se locomovem com muletas e outros equipamentos auxiliares. Podemos citar, por exemplo, sinalização sobre desníveis no ambiente;


· A sinalização tátil deve ser instalada com foco nas pessoas com baixa ou total deficiência visual. Placas em braile, por exemplo, são soluções adequadas;


· Todo estabelecimento comercial deve ter uma rota acessível; isto é, é um trajeto contínuo que não pode ter qualquer obstrução e ainda apresentar sinalização adequada, tantos em ambientes internos como externos. Deve permitir acesso autônomo (sem a ajuda de terceiros) e pode conter instalação de rampas, dependendo da necessidade do local. É uma das normas de acessibilidade mais importantes;


· As vagas especiais de estacionamento para pessoas com deficiência devem obedecer aos seguintes padrões: localização próxima à entrada do estabelecimento e acesso facilitado ao local. Não podem estar localizadas em pontos distantes e devem ter sinalização diferenciada (marcação visível e tátil);

Aprimorando e ampliando a questão da acessibilidade, em 6 de julho de 2015, foi editada a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), Lei nº 13.146, que em seu artigo 54 assim dispõe:

Art. 54. São sujeitas ao cumprimento das disposições desta Lei e de outras normas relativas à acessibilidade, sempre que houver interação com a matéria nela regulada:


I - A aprovação de projeto arquitetônico e urbanístico ou de comunicação e informação, a fabricação de veículos de transporte coletivo, a prestação do respectivo serviço e a execução de qualquer tipo de obra, quando tenham destinação pública ou coletiva;

II - A outorga ou a renovação de concessão, permissão, autorização ou habilitação de qualquer natureza;

E segue no art. 56:

Art. 56. A construção, a reforma, a ampliação ou a mudança de uso de edificações abertas ao público, de uso público ou privadas de uso coletivo deverão ser executadas de modo a serem acessíveis.

Os critérios e parâmetros técnicos a serem observados no projeto, na construção, na instalação e nas adaptações de edifícios, mobiliários, espaços e equipamentos urbanos estão devidamente regulamentados pela norma técnica NBR 9050, elaborada pela Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT

Tomando por base um caso concreto analisado pelo nosso escritório, surgiu a seguinte questão: em um imóvel locado para restaurante, a Prefeitura Municipal autuou o proprietário do estabelecimento para proceder às obras de adaptação para fins de torná-lo acessível. Diante, fomos consultados se essa responsabilidade é do proprietário do imóvel ou do locatário, proprietário do estabelecimento.

O artigo 22 da Lei 8.245/91 (Lei de Locações) dispõe que:


Art. 22. O locador é obrigado a:

I - Entregar ao locatário o imóvel alugado em estado de servir ao uso a que se destina;

(. . .)

III - Manter, durante a locação, a forma e o destino do imóvel.

Nosso entendimento é que a obrigação do locador se refere ao estado físico do imóvel, sua estrutura, sua regularidade fundiária e estar apto para que o locatário possa explorar o ramo de seu interesse. Todavia, havendo exigências legais de adaptação do imóvel para a atividade a ser explorada pelo locatário, essa obrigação deve se voltar a ele, locatário, e não ao proprietário locador.

É o que se verifica da decisão do Eg. Superior Tribunal Justiça (STJ), no julgamento do Recurso Especial nº 1.317.731-SP, de relatoria do Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, em 26/4/2016, que assim decidiu:

“RECURSO ESPECIAL. CIVIL. LOCAÇÃO COMERCIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. SÚMULA Nº 7/STJ. OBRIGAÇÕES DO LOCADOR. ART. 22, I, DA LEI Nº 8.245/1991. ENTREGA DO IMÓVEL EM ESTADO DE SERVIR AO USO A QUE SE DESTINA. ALCANCE DA NORMA.

1. Cinge-se a controvérsia a saber o alcance da obrigação do locador, prevista no art. 22, I, da Lei nº 8.245/1991, sobretudo se lhe compete a regularização do bem junto aos órgãos públicos segundo a atividade econômica a ser explorada pelo locatário.


2. A determinação legal de que é dever do locador entregar ao locatário o imóvel alugado em estado de servir ao uso a que se destina (art. 22, I, da Lei nº 8.245/1991) está ligada à modalidade de locação em si mesma considerada, se residencial, comercial ou para temporada.


3. Na hipótese de locação comercial, a obrigação do locador restringe-se, tão somente à higidez e à compatibilidade do imóvel ao uso comercial. Salvo disposição contratual em sentido contrário, o comando legal não impõe ao locador o encargo de adaptar o bem às peculiaridades da atividade a ser explorada, ou mesmo diligenciar junto aos órgãos públicos para obter alvará de funcionamento ou qualquer outra licença necessária ao desenvolvimento do negócio.


4. Os deveres anexos à boa-fé, especialmente os deveres de informação, cooperação, lealdade e probidade exigíveis das partes na execução dos contratos, contudo, impõem ao locador uma conduta colaborativa, no sentido de fornecer ao locatário os documentos e informações necessárias à implementação da atividade no imóvel objeto da locação.


5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.”


À Prefeitura Municipal, deparando-se com um cenário de desobediência à Lei 13.146/15 e às normas fixadas pelo Código de Obras e Edificações (que também trata de acessibilidade), cabe autuar quem está explorando a atividade em imóvel não acessível, impondo a esse, a obrigação de adaptá-lo sob pena de multa e de interdição.


Este fato não pode, todavia, estender a responsabilidade da atividade, ao dono do imóvel que não tem controle e ingerência na exploração da atividade empresarial do locatário.



- Ramos, Flavio

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